Há ouvidoria na Abin!

H. R. de O. Professor universitário, mestre em administração

Conta a história que o chanceler alemão Otto Von Bismarck (o Marechal de Ferro) num rompante de mera vaidade resolveu desapropriar as terras de um camponês. Entretanto, não esperava ele que aquele cidadão, inconformado que ficou, fosse buscar no Estado-juiz a tutela jurídica sobre os seus direitos, acreditem, usurpados pelo próprio Estado.

A justiça bem entendeu que o líder germânico havia desapropriado aquele imóvel sem nenhuma finalidade pública, razão pela qual determinou a devolução da mesma, o que se deu logo a seguir.

A imprensa, como não poderia deixar de noticiar o fato, perguntou àquele camponês vitorioso o que o motivou a enfrentar o Império, tendo ele respondido: ?Há juízes em Berlim!?.

Faço dos registros históricos a introdução para comemorarmos o dia do Ouvidor, criado em 2001, durante o VI Encontro Nacional de Ouvidores/Ombudsman, realizado na cidade de Recife/PE. Interessante, caro leitor, é o registro paradoxal de que este personagem (Ouvidor) surge na sua gênese na China, onde o povo poderia reclamar contra as injustiças da administração pública.

Não obstante o dia festivo - bem o merece - resta-nos a oportunidade de refletirmos e discutirmos sua importância e o seu papel em nossa Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

A nossa Abin, a quem já dediquei mais de vinte e cinco anos de trabalhos, com zelo e responsabilidade, apesar de malfadadas línguas, vive um momento único de sua jovem história, somente superado pelo seu antecessor o Serviço Nacional de Informações (SNI) que atuando de forma própria e necessária a uma determinada época, não deve ser julgado pelos olhos do presente, mas sobre o que havia a ser tratado no passado.

O SNI agora é história e como toda história deve ser revisitada para que não se repitam os erros de então, mas que com eles aprendamos a construir uma instituição sólida, perene, ética, confiável para se fazer necessária ao Estado brasileiro e que possa, com hombridade permitir que seus servidores façam diuturnamente autocrítica.

O momento político institucional tem de ser visto como um mal necessário. Temos que olhar o nosso umbigo, conhecer nossas entranhas e descobrir o câncer que corroi nossas almas e nossa instituição para extirpá-los, antes que outros o façam em nosso lugar, o que certamente será muito mais doloroso.

Lembremo-nos das palavras de Will Durant, pensador estadunidense que escreveu: ?Uma grande nação não se conquista por fora sem que antes se destrua por dentro?. Por analogia reflito as questões internas da Abin, daí de forma insofismável, a importância do Ouvidor, que não pode em hipótese alguma perder a oportunidade em ajudar a corrigir um erro, explicar um mal entendido e definitivamente não ?administrar conflitos?, mas enfrentá-los, apesar de que na maioria das organizações, e a Abin não é diferente, existe o medo latente de desagradar o chefe, pois erroneamente existe uma falsa impressão de que conflitos não são resolvidos.

Entretanto, senhora Ouvidora, conflitos são necessários. São neles que praticamos a dialética, a ?boa revolução?, como bem disse nosso ex-diretor-geral - de saudosa lembrança - Comandante Márcio Buzanelli.

Desta forma assisto, mas não mais silente, conflitos sendo ?varridos para debaixo do tapete? e chefes corporativos dizendo que está tudo bem, mas não percebem que o conflito está de forma sub-reptícia contaminando todo o ambiente psicológico ou o clima da cultura organizacional, ou seja, conforme bem disse Garet Morgan, quando nos tornamos instituições vistas enquanto prisões psíquicas, ou seja, prisioneiros de imagens, idéias e pensamentos que não evoluem.

Mas, voltemos nossos olhos para a figura do Ouvidor, pois quero afirmar e acreditar sem sombras de dúvida que: ?Há Ouvidoria na Abin!?.

Registre-se que não faço manifestação de apreço à pessoa da senhora Ouvidora - até mesmo porque não a conheço pessoalmente - mas insisto em dizer que a função do Ouvidor e do instituto da Ouvidoria, não pode ser engessado e não deve servir aos interesses de quem governa, mas do governo.

A douta Ouvidoria tem necessariamente de ser autônoma e com capacidade de induzir mudanças e melhorias institucionais, permitindo ao servidor poder se dirigir ao ouvidor sem as amarras do controle, mas de forma democrática, nos dando o alento de poder exercer o legítimo direito do cidadão, qual seja, opinar com respeito e responsabilidade sem que seja alcunhado como ?servidor problema? - a solução mais fácil.

Que o Ouvidor possa por empatia perceber a angústia dos servidores - lembrando que ele também o é e de sua própria transitoriedade - convergindo sua função em prol do resgate da dignidade e da honra do servidor desta casa muitas vezes jogada na lama pelo estamento burocrático.

Que o Ouvidor saiba sempre ouvir. Saber ouvir certamente é uma arte que poucos conseguem exercê-la em sua plenitude, pois o seu oposto, falar, bem refletiu Sêneca ao nos ensinar: ?O sábio é aquele que tem algo a dizer e o tolo aquele que tem de dizer algo?. Assim sendo, tenho de dizer: Façamos, senhora Ouvidora, deste limão que assola nossa instituição, uma saborosa limonada e, com a visão tão necessária do homem justo, vamos todos pavimentar a estrada da ética, ceifando o sorrateiro, o assédio moral, a incompetência, os bajuladores, para que a nossa Abin tenha dias mais do que gloriosos.

Parabéns pela data de hoje e que tenha sempre sucessos no seu labor.